quinta-feira, 24 de março de 2016

Gestando os Pais




Muita indecisão, muitas hipóteses, abertura para várias ideias, restrições de grana. ..
E quando tudo já foi dito e feito por outras pessoas ou ancestralmente, e está pronto ao alcance de suas mãos, como e o que optar desse tudo? E se algumas coisas você negar?

Trabalhando com variáveis conhecidas, sob um mistério que cresce em sua barriga, como abandonar a ansiedade, e a pressão? Posso reconhecer que estou diferente. Deve ser esse mistério dos dois corações batendo juntos, ela me conhecendo por dentro, .. meus olhos aqui do lado de fora, Cibele escondida aqui dentro, e já me sinto naquelas esparrelas em que ou você cresce, ou cresce.

Eu que tenho algumas dificuldades de iniciativa e empreendedorismo, uma indecisão que me acaba, conjugada a um senso crítico e autocrítico especialmente sádico, faria o que sem os amigos? Aqueles que dizem aquelas coisas que você a primeira vista não acredita, não aceita, ou nega, mas que são sempre boas de ouvir, e depois ir reconhecendo algumas, e refletindo mais.. Ou então por te ajudarem em coisas por complementaridade, .. já conhecem suas fraquezas.

Descubro vivendo, que uma gestação te fragiliza. Te coloca as vezes em protagonismos constrangedores. Te insere em uma confraria muito empática repleta de experiências, opiniões e savoir-faire. Também te coloca em uma posição abnegada de reencontro com seus instintos, e entrega ao imponderável.

Vinte e nove semanas se completaram. E tenho muitas coisas para assimilar. Não sou uma pessoa tranquila. Uma mente impertinente me tira o foco, além do que a própria conjuntura atual também propicia, já o explica a vasta bibliografia, além das experiências alheias =].. 

Não estou sozinha. Penso que a experiência de assimilação, expectativa, aporte, de Danilo não seja menos simples. Estou vendo um pai se insinuando em gestos simples e ações inusitadas, preocupações compartilhadas... como outro dia em que ele me diz “não entendo nada de parto, precisamos estudar!” ao que eu respondo a mesma coisa com naturalidade contente.



25 semanas




O que sabe um pai sobre gravidez? 
Como tornar-se essa figura que remete a proteção, ao cuidado externo? 

Sim, externo, pois me parece que está sempre a circundar, em vigília por sua família, contorna seu próprio meio, o território que cabe, qual habita. 

Como tornar-se pai? Palavra estranha para sair assim da boca. 
Sou pai. Vou ser pai. 
Quando saber que já se é? 

É bem verdade nunca me vi responsável por nada, nem por mim. Mas quando a vida chega, quando lhe entrega sobre cuidado a vida de outro, como se negar a responsabilidade do futuro? 

Não há alternativa a não ser dar de si o máximo possível e lançar-se junto no desejo de bem-aventurança. Diminuir as incertezas com a dedicação e tornar-se outro, pois a vida lhe exige que se reparta o egoísmo de si com esse outro que vem. 

Que se invoque essa ancestralidade paterna para que ela pulse nas veias, e de força para a carregar consigo. Que junto pulse algo que é parte de si e parte de outro, e que dele apenas solte, quando pulsar o desejo de partir.



pai de Cibe








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*queria homenagear as pessoas que venho infernizando com as ansiedades, dúvidas, expectativas, que tem estado aqui na prática, aqui de longe, .. era pra agradecer o suporte e a interlocução =]..
mas no fim meio que tomou outro caminho
só sei que gostaria de estar escrevendo mais! =s
e pra constar.. é uma reflexão de reconhecimento
de quem sabe que não está sozinha..


e acrescento o plural da família por conta..


eu, Danilo e mini-Ldml!





*edit. 2020

Cibele. acho justo que a lembrança desse post seja pra você. foi maravilhoso te gestar e problematizar questões da existência e da natureza humana a partir desses desafios, dessa experiência que de fato, nunca fiz muita questão de passar, mas que sou grata afinal, de ter me jogado. você viu? seu pai e eu adorávamos te pensar e refletir no quanto você estava transformando a gente, mesmo antes de você chegar...

sabe porque não pensava que ia ser mãe um dia? porque sempre achei que não tinha nada muito valioso a ensinar, e os problemas que eu não sabia resolver não me faziam digna. eu e seu pai morávamos juntos, havia amor, e esse muito amor fez com que eu parasse de pensar, e deixasse você chegar. hoje em dia minha relação com seu pai mudou, é diferente as tratativas, nossas histórias tem outras escolhas. mas continuamos essa base sólida nas pontas, para te fortalecer, te apoiar, aprender com você, .. e crescer.